A “Laranja Mecânica” mudou o futebol. Não há tempo nem espaço para dissertar sobre a revolução futebolística que representou a equipa liderada por Johan Cruijff. Mais do que isso, o genial holandês foi o primeiro a dar ao futebol uma componente de arte ao jogo que moldou as concepções modernas que todos temos do futebol espectáculo. O futebol champanhe. Tal como o Brasil de 82 – mais técnico que táctico -, a laranja nunca ganhou. Mas não ganhou por questões circunstanciais, por uma bola na trave, por um azar ou por uma sorte. E, vítima disso, o ideal laranja foi perdendo sumo. Secou, secou, secou… e, nos dias que correm, só ficaram os caroços. Alguns desses caroços ainda dão, miraculosamente, sumo. Mas de cada vez que um desses caroços, murcha, o futebol fica mais pobre. Mais chato. Mais feio. E, quando os caroços acabarem, acabará o futebol.
Vem isto a propósito de um dos caroços com maior potencial de injectar algum sumo no futebol. Outros caroços já tinham saltado, como o Arsenal de Wenger ou os turcos do Zico. Foram dias tristes. Mas o caroço rei ainda dava esperanças de que pudesse voltar a escorrer sumo nos relvados. Hoje, não. O Man Utd vai à final da Champions. Parabéns ao Ronaldo e ao Nani. Mas vai depois de ter secado um pouco mais a herança laranja.
Esta meia-final era especial. De um lado estava uma equipa que podia retirar o estatuto de melhor futebol do séc XXI ao seu adversário. Perante um Barcelona relativamente moribundo – se comparado com o Barça de há três anos -, o Man Utd podia sair desta eliminatória como o dono do futebol champanhe, asfixiante colectivamente com ocupação plena de espaços e passes a dois toques e imprevisível e apaixonante em termos individuais. Mas não quis. Quis ganhar acima de tudo. E para isso recorreu aos métodos de quem ganhou nos últimos anos: Liverpool, Milan, Mourinho. Mas o Man Utd tem um dever moral perante a sua história e por causa dos jogadores que têm. Há decisões que resumem tudo: a partir de meio da 2ª parte, Ronaldo saiu da frente de ataque (um desperdício completo) para o lado esquerdo. Para quê? Para fechar as subidas do defesa direito do Barça, que estavam a desequilibrar a defesa do Man Utd. Perfeita decisão táctica. Uma vergonha para o futebol que devia ser punida nas instâncias internacionais.
E pronto, o Man Utd vai à final. Se calhar até ganha, porque descobriu o antídoto para o veneno dos outros dois semifinalistas. Mas a gente não queria o andídoto. O antídoto foi a arma da Grécia. O antídoto foi a arma da Itália ou da Alemanha que derrotaram as Grandes Equipas da história do futebol. A gente não queria o veneno, sequer. A gente queria a cura! A cura para este futebol doente, que quer a vitória a qualquer preço. Um preço que, qualquer dia, acabará por matar os sedentos adeptos do futebol inesquecível.