Futebol feliz

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Depois de anos a penar, com Mourinhos, Benitez ou Ancelottis, finalmente o futebol está feliz. Uma obra de dois homens, dois iluminados. Dois catalães cujas decisões e competência fizeram mais pelo futuro do futebol que 20 anos de Champions League. Guardiola e Laporta são as personagens mais importantes do futebol de fato e gravata do século XXI. No mínimo.

A vitória do Barça teve duas ironias: primeiro, não devia ter acontecido, porque foram altamente beneficiados contra o Chelsea. Mas até aí foi uma qualificação para a história, contra o poder que inflacionou o futebol nos últimos anos, destruindo a democracia inerente; depois, ganhou contra-natura, a defender, a controlar… mas com a mesma inteligência táctica, mestria técnica, alma colectiva e rigor mental com que revolucionou o futebol de ataque. E, agora, o futebol moderno.

Para além da incomparável competência do treinador, que junta à capacidade de trabalho e à formação futebolística de excelência, um nível de bom senso raro, este Barça também goza de algo inigualável no futebol moderno: uma gigantesca alma! Um amor à camisola, ao símbolo, à história. Futebolística (Dream Team) e cultural (catalã).

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Finalmente, a vitória deste Barça é a vitória da improbabilidade genética. É uma vitória da esquerda. Não somos todos geneticamente iguais, felizmente. Mas somos todos iguais à luz da lei, somos todos iguais no direito de acesso às oportunidades de sermos melhores, os melhores. Somos todos iguais por precisarmos sempre dos outros, do outro, mesmo do que é diferente. Os pequenos, deformados e feios do Barça impuseram-se aos perfeitos, altos e bonitos do Man U. Porque jogam um futebol que precisa do outro, porque as suas limitações físicas são, de facto, uma vantagem, porque os artistas não são perfeitos. São geniais.

A discussão entre Messi e Ronaldo promete eternizar-se. São dois fenómenos. Mas os dois melhores jogadores de futebol do Mundo, hoje, são o Iniesta e o Xavi. Os motores futebolísticos das duas melhores equipas do mundo, clube e selecção.

Eu tive o privilégio de ver o Barça jogar ao vivo, este ano. Nunca tive tanto prazer em ver o Sporting goleado. Porque só num estádio é que se percebe a dimensão futebolística deste Barça, especialmente no ataque. A perfeição táctica, as jogadas ensaiadas de futebol corrido, o posicionamento militar, o toque e a liberdade para criar, sem complexos. Só no estádio é que percebi que esta é a melhor equipa de futebol que eu vi jogar na minha vida, até hoje. A boa notícia é que, com esta Champions, a probabilidade de ser superada na história aumentou consideravelmente.

PS: Que não se justifique com o exemplo do Barça a aposta do Sporting na formação. Não só é patético, como absolutamente ilusório… Para o Barça é uma questão cultural, para o Sporting é um mero meio de financiamento, que enche o bolso sempre aos mesmos e que dá poucas alegrias aos adeptos. Até nisso, pode ser que a moda do Barça mude alguma coisa em Alvalade (os percursos de Paulo Bento e Guardiola não deixam de ser curioso: circunstancialmente paralelos, mas na essência não podiam ser mais distintos).

Ganhou o futebol Moutinho

Para quem tinha dúvidas sobre a capacidade de o Capitão chegar ao topo do futebol mundial, devido à sua baixa estatura, é ver a média de alturas dos novos campeões europeus. É a vitória dos anões, contra os Golias desta vida! Mas esse é, também, o problema… Espera-se que os tubarões se distraiam mais um pouco com os rapagões altos, louros e largos… e que o nosso pequenino fique escondidinho, a tratar do joelho com fisioterapia de cotonetes… Curiosamente, os cães ladraram e a caravana passou. Agora que os cães pararam de ladrar, será que a caravana parou?

Fodido, mas pouco

Pois. O futebol tem destas coisas… é preciso trabalhar. Portugal perdeu hoje contra uma das piores defesas do Europeu. Mas só percebemos isso durante o último quarto de hora da primeira parte. Antes e depois, foi um rol de disparates estratégicos, que o sr. Scolari proporcionou de uma forma tão eficaz como aquele soco falhado ao Dragutinovic. Jogámos pelas alas para centrar para o Nuno no meio dois autênticos gigantes da feira popular. Andámos sempre à procura do toque e foge num meio-campo de marcações cerradas e encaixadas tacticamente (cada médio tinha um polícia). O Simão jogou na direita (quando nunca o fez em mais lado nenhum da sua carreira) para fechar o Lahm. Mas os alemães furaram exactamente por ali sem precisarem do único anão alemão. Porque o Bosingwa defende mal, o Pepe decidiu ir marcar o Ballack a meio campo e o Paulo Ferreira estava a dormir, como aliás tem sido hábito nos últimos dois anos. Onde andava o melhor do mundo? Perdido na esquerda e a correr para a área para cabecear contra os gajos da feira popular. Quando o Deco percebeu onde estava o buraco (no meio dos centrais, onde não havia trincos e os centrais eram demasiado lentos), mandou o Ronaldo para ali e tentou jogar com ele… durante 15 minutos ele ganhou todos os duelos mano a mano com aqueles troncos e era aí que estava o ouro… (um golo, uma bola a rasar o poste).
Pior só mesmo as substituições: Moutinho lesionado, entra Raul Meireles para fazer o mesmo, mas pior. Nani devia ter entrado muito antes (talvez… de início!). E o Postiga entrou em vez do panzer, o único jogador que tem um equilíbrio físico com os boches. O problema nem foi o Postiga. Foi o facto de NUNCA TERMOS JOGADO COM DOIS AVANÇADOS MÓVEIS CONTRA OS PIORES CENTRAIS DO EURO!!! Quer dizer, o Ronaldo acabou o jogo a ponta-de-lança, a saltar com os gigantones, numa espécie de “dança dos cabeçudos” que conhecemos tão bem…
Muito pior só mesmo as bolas paradas. Não vale a pena desenvolver este tema porque demonstra toda a incompetência dos envolvidos: Scolari insiste em defender ao homem (força Paulo, continua tu também) e o Ricardo é dos piores guarda-redes da Europa (talvez o pior do Europeu?) e continua a fazer merda como nada se passasse. Se o Sócrates quiser ser aceite por Portugal inteiro, só precisa de tirar as luvas…

Tudo para chegarmos à razão pela qual não estou tão fodido como temia. No futebol, poucas coisas acontecem por acaso. E os alemães fizeram o seu trabalho, estudaram os pontos fracos de Portugal e exploraram-nos até à vitória, adaptando mesmo a táctica. Os portugueses? Passaram o tempo a negociar contratos com clubes, a tirar fotos para sites da Internet, a jogar snooker e a assar sardinhas. Alguns até tiveram a lata de viajar em pleno estágio para resolver problemas jurídicos… Os alemães foram para o Euro com todos os melhores jogadores, mesmo os polémicos Podolski, Schweinsteiger (mas ninguém parte uma perna a este gajo?) ou Lehmman. Os portugueses? O melhor defesa esquerdo ficou em casa e o SuperManiche também. Porquê? Porque não concordaram com a estrutura dos prémios de jogo. E porque, digo eu, têm pouco interesse para o mercado dos tubarões.

Fodido, mas pouco. Porque em vez de ver jogadores em lágrimas no final do jogo, vi apenas gajos interessados em ir tomar banho para tratar da vidinha. Leio as declarações e é tudo ” o meu futuro logo se verá”, “há grandes possibilidade”, “o Sporting não dirá não”, “a Portugal não volto”, etc. E o chefe da banda com um sorriso no rosto, do género “quem vier que apanhe os cacos, que eu vou ser milionário e posso comprar as vinhas todas de Portugal, depois”.

Enfim, tenho um divórcio de identidade com esta selecção. Já tinha. Mas a qualidade dos jogadores e as quinas na camisola fizeram-me esquecer isso. Agora, faz-me tanta falta um Figo, um Rui Costa, um João Pinto, um Couto ou até mesmo um Conceição. O final do jogo foi revelador: uma impotência anímica tão forte que assustou… Esta gente vai crescer e vai perceber que jogar pela selecção é o máximo que se pode fazer na carreira. Espero que, nessa altura, haja alguém competente ao leme.

PS: Ó Roberto Leal, aquele dia foi muito fixe, não foi?