Ainda ninguém conseguiu perceber muito bem qual será o futuro de Jesualdo Ferreira. Ou, se preferirem, são muitas as dúvidas sobre quem será o treinador do Sporting na próxima época. É verdade que há uma vontade expressa publicamente, por Bruno de Carvalho e por Virgílio, de continuar a contar com o treinador, mas também é verdade que nenhum de nós sabe que condições lhe terão sido propostas e, mais, se “o professor” terá vontade de trabalhar com este elenco directivo.
Começaria por aqui, pois é a própria postura de Jesualdo a levantar dúvidas. Tão depressa está risonho, como parece estar a despedir-se. Veja-se aquela surreal conferência de imprensa, depois da vitória em Braga, ou o flash interview, dessa mesma noite, onde questionado sobre a presença do presidente no banco afirmou que era bom para que ele pudesse ver que a equipa técnica e os jogadores trabalhavam de forma séria. E veja-se o discurso a propósito de Inácio, este fim-de-semana, onde parecia indiciar que estava pronto a trabalhar com ele. Dúvidas, muitas dúvidas, que todos os envolvidos teimam em manter.
Assim sendo, resta aos Sportinguistas irem esgrimindo argumentos sobre se devemos, ou não, continuar com Jesualdo Ferreira. Ora, eu coloco as coisas de uma forma relativamente simples: depende de quem vier substituí-lo. Estou cansado, sinceramente, de aventuras e de procurar uma espécie de novo Mourinho. E não consigo deixar de achar curioso, ainda haver pessoal capaz de passar um cheque em branco a nomes como Rui Faria. Tudo mudaria de figura se me apresentassem um Gérard Houllier, um Bielsa ou um Dick Advocaat, nomes capazes de chegar e ensinar a jogadores novos, velhos, a adeptos, a jornalistas e a colegas de profissão.
Voltando a Jesualdo, e porque tudo o resto são pensamentos soltos numa péssima conjuntura económica, seria injusto não destacar o trabalho que tem feito. Pegou na equipa em cacos, praticamente sem noções de jogo (inacreditável, sinceramente) e, actualmente, vemos onze homens em campo a saberem como devem posicionar-se e como devem movimentar-se. Estamos muito longe do futebol que todos desejamos, é verdade, mas também é verdade que os índices de confiança só agora começam a sair do vermelho e que fazer uma pré-época com a época pela metade não será propriamente simples. A aposta na juventude foi mais uma necessidade do que uma estratégia, e aproveito para deixar já claro que me parece abusivo o rótulo de treinador especialista em trabalhar com jovens que têm tentado colocar em Jesualdo. Tal como continuo a achar que Jesualdo é um treinador pouco ofensivo e com tendência a perder alguns jogos, precisamente por essa tendência de “jogar pelo seguro” (um problema da maioria dos treinadores portugueses, diga-se). E não consigo “engolir” esta tentativa de transformar Dier em médio (foda-se, aquele que foi considerado o destaque da segunda liga joga no Sporting B e chama-se João Mário, só para dar um exemplo) e a insistência em Rojo a central (toda a gente já viu que não dá), quase parecendo querer provar que é capaz de “inventar grandes soluções” (eu prefiro uma omoleta com queijo bem feita, do que quererem que eu ache uma maravilha uma omolete de camarão feita com gambas de isco).
A verdade é que, por aquilo que disse atrás, Jesualdo conseguiu reunir alguns créditos a seu favor: parece ter sido capaz de unir o balneário, criando um espírito de camaradagem que parecia não existir; o discurso dos jogadores dá a entender que sentem que têm algo a aprender com ele; vai acumulando conhecimento dos jogadores com quem trabalha, como mostram as recentes palavras a propósito de Viola ou a muito boa análise a Rinaudo (O Fito será sempre muito melhor jogador na equipa do Sporting ou noutra qualquer enquanto for capaz, e está a ser, devagarinho, de saber coordenar os seus movimentos e comportamentos tácticos de acordo com os próprios movimentos da equipa. A ideia de ter de fazer o trabalho dele e dos outros, de ir ali resolver um problema, ir ao outro lado apagar um fogo, depois ir a correr com a bola sem ter em quem a meter… nenhum jogador faz isto com qualidade e ele está devagarinho a perceber que o jogo é outra coisa além daquilo que ele sabia e pensava. Com o colectivo forte ele é grande, também), podendo ser esse conhecimento fundamental no arranque de uma nova época.
A tudo isto se junta uma experiência que, goste-se ou não, faz de Jesualdo um homem que percebe de futebol (até dos bastidores do mesmo, ou não tivesse passado ele por Benfica, Braga, Boavista e Porto), carregando sobre os ombros uma sombra: a de ser um treinador que, apesar da experiência, só conseguiu triunfar num clube que funciona como uma máquina bem oleada. Tinha o apoio de um director desportivo, tinha um balneário blindado, tinha a definição das contratações feita a tempo e horas e feita com critério, tinha um plantel competitivo, tinha um presidente que defende o clube. Assim, Jesualdo apenas tinha que dedicar-se à equipa e à preparação do futebol da mesma. Em Alvalade, a máquina foi deixada à beira da sucata, com óleo tão velho que se torna papa e dificulta os movimentos. A reparação vai demorar o seu tempo e a grande dúvida, neste momento, é saber se será Jesualdo capaz de lutar pelo sucesso sem as mordomias, incluindo extra-futebol que, outrora, lhe valeram atingir conquistas. E se, ele mesmo, está disponível para enfrentar aquele que poderá ser o maior desafio da sua carreira.