O amor existe?
Eu acho que sim, e tive essa prova por volta dos 11 anos…
Num belo domingo de Primavera a terceira mulher do meu pai, em grande altercação afirmou:
-“Ou eu, ou o Sporting, escolhe!!”
O meu progenitor, qual Peyroteo, não hesitou e fulminou:
– “O Sporting, claro”
E lá seguimos calmamente até Alvalade para mais um domingo desportivo, cujo programa incluía; Jogo de juniores, uma qualquer modalidade amadora e o ponto alto do dia; Manuel Fernandes-Oliveira-Jordão.
Não é bonito o amor?
Haverá maior prova de amor à camisola?
Se Moutinho tivesse um décimo deste sentimento teria agido da mesma forma?
Não creio.
Na década em que nasceu o pequeno João, começou a crescer a ideia de que o amor à camisola era um sentimento fora-de-moda, passou a ser do senso comum que os jogadores, com 12/13 anos de carreira, tinham de maximizar o que a curta profissão lhes pode oferecer.
Os empresários – essa nova classe laboral – apoia esta ideia, os valores dos contratos sobem exponencialmente graças à lei Bosman, os direitos televisivos trazem mais dinheiro, a bola domingueira transforma-se numa indústria.
O filho do mítico Zé Águas transfere-se do Benfica para o Porto… por dinheiro.
Paulo Futre, grande esperança Sportinguista, vira costas a quem nele apostou… por dinheiro.
Jaime Pacheco, Sousa, Inácio, Gabriel, Fernando Mendes, Paulo Sousa etc, etc.
Quando o pai de Moutinho tentava jogar no Benfica (já devíamos ter desconfiado desses genes manhosos), ao Sporting chegou aquele que porventura foi um dos melhores Capitães da nossa história, Manuel Fernandes.
Mentiu à família para não ir para o Porto, recusou convites do Benfica, prejudicou-se financeiramente… por amor ao clube.
Numa entrevista em jeito de balanço no final da carreira disse: “mais do que qualquer golo ou qualquer jogo, o maior momento de glória da minha vida foi aquele em que vesti, pela primeira vez, a camisola do Sporting”.
Isto é amor, foda-se!
Creio que a generalidade da minha geração viu no Moutinho a reencarnação deste espírito, mas pelos vistos enganámo-nos redondamente.
Afinal a ambição sobrepõe-se à humildade, afinal o “profissionalismo” sobrepõe-se ao Sportinguismo, afinal o dinheiro sobrepõe-se aos valores, afinal…é como tantos outros, apenas um bom jogador, sem amor ao clube que o criou.
É pena, podia ser um grande símbolo, tinha condições para bater quase todos os recordes de leão ao peito, entrar na galeria dos imortais, mas não, em quinze segundos de declarações infelizes, estragou tudo.
Ou estou a ficar velho, ou o amor já não é o que era.